Desde o marco legal que permitiu o surgimento das instituições de pagamento (IPs), em 2013, a quantidade de pedidos de licença para operar com essa modalidade vem crescendo. De lá pra cá, foram 239 pleitos ingressados no Banco Central (BC), dos quais 149 foram decididos — atualmente, 62 companhias têm autorização para atuar como IP.
A tendência é que esse número cresça substancialmente nos próximos meses. Atualmente, há 90 pleitos em análise no BC. A maioria (51) é para se tornar IP na modalidade de emissor de moeda eletrônica, que permite gerir contas de pagamento pré-pagas — caso de muitas fintechs que nasceram e se desenvolveram nos últimos anos.
As 39 solicitações restantes para operar como IP são divididas entre postulantes a iniciador de transação de pagamento, os chamados ITPs — ao todo, existem 10 instituições na fila. Há, ainda, cinco empresas pleiteando ser emissor de instrumento pós-pago, por exemplo, instituições não financeiras que desejam emitir cartão de crédito.
E, por fim, a lista de pleitos inclui 24 pedidos “híbridos”, ou seja, que pretendem ser emissor de moeda eletrônica associado a uma das outras três modalidades (emissor de instrumento de pagamento pós-pago, ITP ou credenciador). Os dados foram apresentados por Carolina Bohrer, chefe do Departamento de Organização do Sistema Financeiro (Deorf) do BC, em evento do escritório Barcellos Tucunduva Advogados (BTLAW), na última sexta-feira (4).
“Começamos a ver uma aceleração de pleitos para ITP, que estão ligados à evolução da agenda do Open Finance”, disse Carolina. “Foi um processo adiantado pelo WhatsApp Pay e agora vemos maior interesse por conta do Open Finance. Temos atores relevantes entrando, tanto nacionais quanto big techs”, citou ela.
O Finsiders tem acompanhado de perto o crescimento deste mercado, ainda em estágio inicial. Recentemente, bancos como Mercantil do Brasil, Inter e XP anunciaram funcionalidades de iniciação de pagamentos. Atualmente, 14 instituições estão aptas a operar o serviço, que faz parte da fase 3 do Open Finance. No grupo estão desde grandes bancos como Bradesco, Itaú e BTG até fintechs como Mercado Pago, Celcoin e Gerencianet.
Ao mesmo tempo em que cresce a lista de solicitações para atuar como ITP, a diretora do Deorf, do BC, chama atenção para a ausência de solicitações de instituições para se tornar credenciador, por exemplo. “Não temos pleito novo de credenciador. É um mercado já bastante saturado, e ganhar dinheiro com ele já não é algo simples.”
O incentivo à competição é uma das bandeiras levantadas pelo Banco Central a partir da chamada Agenda BC#, que inclui inovações como o Pix, o Open Finance, o sandbox regulatório e o futuro real digital (a CBDC brasileira), entre outras iniciativas.
“O que temos visto, por conta do pilar de competição da Agenda BC# e do próprio desenvolvimento do mercado com as IPs e as fintechs de crédito, é um volume bastante relevante de novas instituições”, disse Carolina. Segundo ela, há uma evolução de IPs “tradicionais”, agregando novos serviços, assim como um movimento crescente do “embedded finance”, com empresas de diferentes setores criando suas licenças de IPs ou mesmo de fintech de crédito, principalmente Sociedade de Crédito Direto (SCD).
“Temos visto um aumento de demanda de empresas que já têm IPs e querem agregar SCD”, exemplificou. “O [fenômeno] do ‘embedded finance’ traz desafios que nos fazem reinventar a roda todos os dias”, disse ela, citando que a autorização para se tornar uma instituição regulada é apenas o início do processo. “É um relacionamento que queremos que seja duradouro.”
Em sua fala, Carolina citou também que a autoridade monetária estuda a possibilidade de prorrogar o prazo para as instituições de pagamento emissoras de moedas eletrônicas darem entrada no pedido de autorização de funcionamento.
Atualmente a regra determina que todas as instituições de pagamento que exerçam esta atividade devem encaminhar o pedido de funcionamento, no máximo, até 31 de março de 2023. Já as IPs emissoras de instrumento pós-pago e credenciadoras devem continuar com a necessidade de pedir autorização de funcionamento somente após o atingimento da volumetria de R$ 500 milhões transacionados, no período de 12 meses.
No evento, Giancarllo Melito, advogado especialista em meios de pagamento e fintechs e sócio do Barcellos Tucunduva (BTLAW), destacou a importância dos esclarecimentos do Banco Central diante de um público formado, em sua maioria, por fintechs. “Ainda há muitas dúvidas sobre volumetria, prazos e outros aspectos regulatórios. A sinalização de adiamento de prazo, para as emissoras de moeda eletrônica, é positiva”, afirmou.
Embedded finance
Em sua fala, Carolina mencionou alguns modelos de negócio que vêm ganhando espaço no setor financeiro, cada vez mais múltiplo e disputado por atores diversos. Um dos exemplos são os ecossistemas digitais completos (super apps), que agregam atividades de pagamento, conta digital, cartão, empréstimos, investimentos, seguros, planos de celular, marketplace, delivery. “É o que temos chamado de instituição múltipla não bancária”, disse Carolina. Os exemplos incluem Ame, PicPay, banQi, Inter, entre outros.
Outro caso é o de emissor de moeda eletrônico com a atividade de subcredenciador. São instituições que oferecem, por exemplo, contas de pagamento para crédito dos recebíveis, soluções de ERP e produtos e serviços para nichos de negócio, como cadeias de distribuição. O BEES Bank, da Ambev, é um exemplo nesse sentido. Outro, que acaba de receber autorização de SCD, é o Natura &Co Pay, a unidade de serviços financeiros da empresa de cosméticos.
Dois outros movimentos que ganham força, conforme citou Carolina, são banking as service (BaaS) e instituições de pagamento que estão evoluindo sua plataforma de serviços, agregando novas funções, como crédito, investimentos, seguros, marketplace e cripto — esse último produto, por meio de parceiros.
Novas regras para IPs
Em março deste ano, o Banco Central publicou as novas regras prudenciais para as IPs. Em suma, determina que as IPs terão regras proporcionais ao seu porte e à sua complexidade. O conjunto de normas entrará em vigor em janeiro do ano que vem, mas a implementação completa ocorrerá em janeiro de 2025.
Pelas novas regras, os conglomerados prudenciais serão classificados em três tipos:
- Tipo 1: conglomerado prudencial liderado por instituição financeira;
- Tipo 2: conglomerado prudencial liderado por instituição de pagamento e não integrado por instituição financeira ou por outra instituição autorizada a funcionar pelo BC; e
Tipo 3: conglomerado prudencial liderado por instituição de pagamento e integrado por instituição financeira ou outra instituição autorizada a funcionar pelo BC.
*Reportagem atualizada com mais informações sobre as regras para IPs.
Fonte: Finsiders