A mãe de um menino de quatro anos usou as redes sociais para denunciar que uma foto do filho foi tatuada sem permissão no corpo de um desconhecido em São Bernardo do Campo (SP). A tatuagem em questão foi copiada de um ensaio fotográfico feito em janeiro.
Em entrevista ao UOL, Preta Lagbara, moradora do Rio de Janeiro, contou que descobriu que o registro do filho Ayo, feito pelo fotógrafo Ronald Santos durante um ensaio na Floresta da Tijuca, estava tatuado no corpo de um homem após ser avisada por amigos nas redes sociais.
“Entrei em contato com o tatuador, mandei mensagem, alguns filhos de santo meus também procuraram ele, mas a gente não conseguiu resposta. Não tivemos nenhum tipo de retorno. Comentei na própria foto, no Instagram dele, falando: ‘Onde você teve acesso a essa foto? Como assim, você tatuou o rosto do meu filho?’. De início, até achei que era uma imagem ilustrativa, mas depois vi que ele tinha participado de um prêmio e tirou inclusive segundo lugar com essa imagem”, conta a mulher.
Após não receber retorno do tatuador, ela compartilhou ontem uma nota conjunta com o fotógrafo responsável pelo registro nas redes sociais denunciando o ocorrido.
“Estamos em 2022 e nossas imagens ainda continuam sendo usadas sem nossos consentimentos”, lamentou o fotógrafo Ronald Santos em publicação.
O fato ganhou repercussão e compartilhamentos nas redes. Segundo Preta, após a nota de denúncia, o tatuador a procurou por mensagem no Instagram, disse que ficou sentido com o caso e que não sabia que “iria ferir o orgulho dela com a arte dele”.
“Não se trata da arte, do talento dele, ninguém está questionando isso. O que se trata é que ele não pode simplesmente achar que em pleno 2022 as pessoas ainda têm direito de pegar uma foto de uma criança aleatória e tatuar no corpo de alguém. Você pegar uma foto, levar para um concurso, e tatuar no corpo de alguém que nunca teve algum tipo de contato com a criança é um absurdo, é desrespeitoso, desumano. Meu filho não é um animal em zoológico”, afirma.
Segundo ela, o tatuador Neto Coutinho justificou que retirou a imagem do Pinterest, sem saber de quem era a fotografia. “Só existia uma foto lá [no Pinterest]. Quando você clica nessa foto, o link leva diretamente ao fotógrafo. Se ele [Neto] quisesse chegar no Ronald, que é um fotógrafo conhecido, ele tinha como”, afirma.
Preta contou, ainda, que recebeu alguns comentários maldosos de pessoas após a denúncia. Segundo ela, alguns colegas do tatuador disseram que ela deveria “agradecer pela arte” com a imagem do menino.
Nas redes sociais, Preta afirmou que o ensaio fotográfico de Ayo foi feito após muito diálogo com o filho. Ela disse, ainda, que o fotógrafo respeitou o tempo da criança e fez os registros com paciência, sem forçar o menino a fazer nada que ele não queria.
Agora, assistida por um advogado, ela pretende buscar medidas para reverter a exposição causada pela tatuagem.
“Não quero o rosto do meu filho tatuado no corpo de ninguém, muito menos em uma pessoa que não tenha vínculo com ele. A gente quer ou que ele cubra esse desenho, ou tire o desenho. Eu não sei, mas ele vai ter que dar um jeito. Não quero essa tatuagem do meu filho exposta no corpo de uma pessoa que não me conhece”, afirma.
O tatuador Neto Coutinho usou as redes sociais para se posicionar sobre o assunto. Em uma publicação assinada pelo advogado Gabriel Rodrigues, o perfil do tatuador expressou “profundo pedido de desculpas, principalmente aos pais, familiares e à própria criança”.
Na postagem, ele reconheceu “o equívoco cometido” e disse que não tinha intenção de trazer prejuízo para os envolvidos. “A par disso, assenta-se o total interesse e disponibilidade de o artista resolver possíveis pendências juntamente com o fotógrafo e com a genitora da criança representada”, afirmou.
O tatuador pediu, ainda, desculpas à comunidade preta, da qual disse fazer parte. A reportagem procurou o tatuador por e-mail e redes sociais, mas não houve retorno. O espaço segue aberto para posicionamento.
O que a lei diz sobre o caso
O advogado especialista em propriedade intelectual do Barcellos Tucunduva Advogados, Luiz Fernando Andrade, explicou em entrevista ao UOL que a utilização da fotografia sem autorização do responsável pela captura pode configurar em crime de violação de direitos autorais.
Ele explicou, porém, que usar a imagem de alguém sem a autorização da pessoa retratada pode ser considerado um crime caso a foto retrate nudez ou um contexto de injúria, pornografia, racismo ou outro tipo de preconceito.
Nos dois casos, o fotógrafo e o fotografado podem entrar com pedidos de indenização por danos morais ou materiais ao tatuador e ao tatuado.
“No caso de uma ação contra a pessoa que foi tatuada, há algumas complicações adicionais por questões envolvendo a integridade física dela. Ninguém pode ser obrigado a remover uma tatuagem, por ser um procedimento invasivo que afeta sua integridade física, então a ordem judicial para deixar de usar a imagem teria que se limitar à exposição dela em redes sociais e seu uso em fotografias e publicidade, por exemplo”, explica o advogado ao UOL.
Fonte: Portal UOL.